Nunca uma música veio tanto na minha cabeça quanto “No Ceará não disso não”, gravada em 1950 por Luiz Gonzaga.
No imaginário de grande parte da população do Brasil, principalmente de Minas Gerais para baixo, o cearense é aquele fulano de cabeça chata e morto de sede cuja única motivação na vida é entupir (para não dizer “infestar”) as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.
Outro estereótipo que o cearense tem é aquela maldita idéia, reforçada por muitos cearenses infelizmente, de que no Ceará o povo é moleque, bem-humorado e receptivo, e que a comédia é algo inerente ao espírito coletivo dos nativos da chamada “Terra do Sol”.
Antigamente eu achava interessante quando passava, na televisão, aquele montão de comediantes, 95% cearenses, mas chega uma hora em que isso incomoda: dá a péssima impressão de que no Ceará é só isso mesmo, uma grande esculhambação, um povinho que não leva nada a sério, um bando de ignorantes cabeças-chatas que, sem ter água no sertão, vai “procriar” e multiplicar a chamada “sub-raça” nas terras do “Sul Maravilha”.
“No Ceará não tem disso não”, como diz a velha canção.
No Ceará tem gente trabalhadora e honesta, que não se resume apenas a contar piadas imorais e sem graça.
No Ceará não tem só bandas de “forró” com letras chulas e indecentes, tem artistas com músicas que, mesmo que muitas delas sejam antigas, podem ser ouvidas sem problema nenhum.
No Ceará não tem só terra seca, também há muito verde, como na Chapada da Ibiapaba, no Maciço de Baturité ou na Serra de Guaramiranga.
No Ceará não tem só gente ignorante, dele saíram pessoas como José de Alencar e Rachel de Queiroz: goste-se ou não do estilo deles, as obras que ambos deixaram influenciaram grandemente a literatura brasileira. Inclusive a Academia Cearense de Letras é a mais antiga de todas as academias do país (fundada em 1894), até mesmo a Academia Brasileira de Letras (fundada em 1897).
No Ceará não tem só energúmenos, tem também gente da qualidade de um Euclides Pinto Martins, aviador brasileiro, natural de Camocim, terra dos meus pais. O aeroporto de Fortaleza leva seu nome.
No Ceará não tem só gente da “cabeça-chata”, também tem negros, índios e brancos - até os de olhos azuis, entre os quais meu pai.
Nunca gostei daquela idéia de “orgulho gaúcho”, “orgulho paulista”, “orgulho negro” ou “orgulho nordestino”, pois acho isso uma baita frescura, mas às vezes me dá vergonha de ter sangue cearense, quando vejo elementos como um Tiririca da vida, que se candidata a deputado sem nem ao menos saber o que faz um parlamentar.
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